Quantos de nós, fazendo um mergulho interior, livre de quaisquer tipos de peias, podem bater no peito e dizer que não há em nossas próprias histórias nenhum tipo de arrependimento? Duvido que haja um!
Aliás, duvido que haja um único ser humano medianamente equilibrado do ponto de vista psíquico capaz de dizer que nunca errou. E vou buscar aqui em conforto de minha alegação a suposta defesa de Maria de Magdala, feita por Jesus diante dos escribas fariseus, ao possível flagrante de traição. Suposta porque, afirmam alguns estudiosos - não sou versado em estudos bíblicos -, o episódio seria acréscimo apócrifo ao texto de João.
Se foi acréscimo, foi um acréscimo e tanto, porque a frase, sintética e perfeita defesa da suposta pecadora, é lapidar e capaz de demolir qualquer tentativa acusatória por parte dos seguidores da literalidade da lei mosaica: "Quem dentre vós não tiver pecado, que atire a primeira pedra". A propósito, ainda que não exatamente sobre a cabal assertiva de Jesus, mas no mesmo caminho, Abraham Lincoln disse que "pessoas sem vícios têm poucas virtudes".
Como afirmei, não sou versado nos textos sagrados e, por isso mesmo, não me atreveria a discorrer sobre eles. Quis apenas trazer em defesa de minha tese, abstraídas as questões religiosas, argumentação que é a síntese de uma postura ética, moral, que induz até mesmo as turbas inflamadas ao reconhecimento do direito à defesa, ao contraditório e à aceitação da diferença, quando confrontadas com a verdade que subjaz na escuridão de suas próprias consciências.
Isso é o que penso, é no que acredito, é aquilo que defendo. Mas não sou o Nazareno e não tenho sua habilidade intelectual, seu requinte espiritual, nem o conhecimento das almas pecadoras que me permitam perorar em defesa do respeito à liberdade de pensamento e à forma de agir de meus semelhantes sem pretender, desde logo, antes mesmo de qualquer julgamento, impor-lhes a lapidação. Por isso, quando posso, escrevo, falo e tento colaborar para criar uma consciência coletiva de respeito às diferentes ideias e de tolerância para com nosso semelhante diferente de nós.
Mas, diante do estado de beligerância em que vivemos, com parcelas significativas de brasileiros instigados, por quem deveria acalmálas, ao arraigamento e à proliferação do ódio, cada vez mais me sinto impotente, quase um imbecil, um idiota (in)útil. Precisamos todos os que, de alguma forma, nos sentimos assim, nos munir da paciência que pensávamos ter se esgotado. Precisamos, para utilizar uma expressão de amplo uso atualmente, ter resiliência. E não é demasia que nos debrucemos na (re)leitura de algumas das obras fundamentais no processo civilizatório nascidas da sabedoria e do conhecimento humanos, principalmente, nas áreas de Ciência Política, de Filosofia e de Sociologia, antes que as proíbam todas.
Para concluir, e ainda uma vez me valendo do ex-presidente norte-americano Lincoln: "pecar pelo silêncio, quando se deveria protestar, transforma homens em covardes." Não só por isso, mas também por isso, escrevo.